...contigo esta noite, eras uma parte ausente de mim mesmo quando olhava em redor e não te via, continuava a achar que tu no sítio onde não tinha ainda olhado. Ao meu redor um sofá branco imenso de pele onde os meus amigos, pelo menos alguns deles, se sentavam relaxados numa pose e com o sorriso de quem encontrou a posição certa para o fazer. Uma mesa de vidro e ferro no meio, um tapete castanho claro, eu o único que sentado no chão, e como dizia antes, olhava em redor e o redor um género de nuvem da qual apenas conseguia perceber que nos envolvia e não demonstrava qualquer zona por onde se pudesse antecipar uma saída. Perguntava-lhes por ti, onde está? Olhava para um telefone cinzento e deformado com uma carapaça dura e que não tinha teclas e somente apareciam nomes de pessoas o teu lá e eu incapaz de escrever, a ansiedade de um som vindo dele e nunca qualquer som. Depressa eu sentado numa mesa de madeira enegrecida pelo tempo e pelos líquidos que nela por certo tantas vezes pousaram, olhar o fundo de um prato onde letras castanhas antigas falavam sobre o cardápio milenar desta casa com cheiro a vinho e cerveja, com balcões em parede caiada, traves de madeira e telhado de duas aguas bem visível de onde estava sentado. Casa cheia com gente da minha idade e apesar de tudo ninguém conhecido, nem uma cara familiar, percorrendo olhos tentando encontrar quem te substituísse e nem uma semelhança, nem uma faísca. Sentado ao meu lado o dono em deveres de apresentação olha para mim enquanto eu olho para o prato e me explica o contexto de fusão antiga portuguesa e comida chinesa. Então reparo atrás do balcão na quantidade enorme de gente de cabelo preto e pele amarelada, vestidos de calças azuis e camisa azul às riscas como se tivessem acabado de vir de um qualquer franchise moderno. Nos armários inevitavelmente em madeira de cor preta caixinhas de massa recheada recém cozidas fumegam, e eu só penso que faz massa dim-sum numa adega portuguesa no meio de copos de barro e rodelas de tinto em relevo no balcão e nas mesas. Que faz este senhor de bigode magro e cabelo grisalho ao meu lado, olhando o meu ouvido e falando para ele como se eu interessado no que me diz, enquanto tento encontrar no fundo do prato uma linha que diga dim-sum e só encontro rojões à transmontana, cozido à portuguesa, pézinhos de coentrada, arroz de polvo e o meu desespero sobe sobe porque ali o que quero e no entanto não o consigo dizer, não o consigo explicar ao senhor que fundiu o tasco e o restaurante chinês e lhe deu o ar de adega de quinta. Mas nunca neste sonho os teus olhos, e é isso que me faz acordar de manhã, procurar a tua mão ao meu lado e por vezes, ultimamente nunca a encontro, e talvez porque nós longe um do outro não possamos sentir o conforto que vem da partilha da mesma cama, talvez por isso os meus sonhos mais complicados, tu sempre mais longe, tu sempre noutro lado e eu sempre a sentir a tua falta. Não sei porquê neste sonho o teu nome Mariana.
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