sexta-feira, 31 de maio de 2013

Era...

...uma conversa calma e tranquila, sentado num pontão à beira mar ou à beira rio, não consigo distinguir a este momento a diferença entre as duas águas já que os meus olhos para lá do longe e do horizonte. Uma certa calma paira numa neblina demasiado branca para que seja real e no entanto o sol escondido algures por detrás de mim dá a claridade do dia que sempre conheci, azul e brilhante. Meus olhos fixos no final e no fundo do que conseguem ver fazem com que perca a noção das palavras de um velho a meu lado, estranhamente sentado com o seu casaco e o seu boné e as suas calças e no entanto os seus pés descalços dentro de água como os meus. Eu pequeno, tão pequeno e inocente, lembro agora, com um olhar curioso, com uma sensação de ser já grande, de saber mais do que aquilo que o meu corpo dava a crer e enquanto o velho me falava eu sabia do que era, pelo modo como o meu ser reagia, pelo incómodo que corria na minha mente que se queria por tudo afastar daquelas palavras e daquelas dores que as suas palavras martelavam nos dedos e nas mãos da minha alma.
Apercebi-me que de nada cresci e que de nada como uma pedra o sentimento caiu no meu estômago como se fora um saco vazio quase a rebentar. A dor de este movimento aumentava e chegava aos pés como se um peso muito grande acabara de lhes cair, e à cabeça como se uma força estivesse a rasgar todos os meus tecidos. E apenas um sentimento a provocar isto, porque seria possível que as palavras de um velho, largadas à água, fossem tão fortes e tão o que precisava de ouvir.
Da neblina branca no fundo do visível, todo o meu mundo obscurecido pela brancura de um nevoeiro imenso e espesso, em que as mãos quase que conseguem sentir a sua viscosidade, a sua textura. E eu de pé, perdido sem olhar em redor porque os meus olhos abertos mas sem ver, porque nada para ver afinal, e os meus pés caminhando na certeza de um solo firme, seco e sem acidentes. E julgava eu ser apenas algo normal que não uma vida, julgava eu que o velho outro, outra cara, outra voz, outra pessoa distinta com um nome e uma morada, uma historia de vida e amigos, com dores próprias e conhecimento.
A sua cara, a sua roupa a dizer-me chama-se José, sabes perfeitamente quem é, o que significa para ti, onde mora e o que tudo o que associado a ele vêm. No entanto nenhum José, a voz que proferia palavras, não as dele, as minhas, e essas palavras tão necessárias.
O meu medo, o meu luto, tudo por uma voz calma, suave e regrada, e se o meu medo e o meu luto todos enviados para mim na forma de palavras e essas palavras uma força que me rasga da barriga para cima e me  esmaga da barriga para baixo porque uma pedra dentro de mim e essa pedra uma dor do tamanho de nada, sem massa ou matéria, tão efémera quanto a neblina que me rodeia e no entanto não me deixa ver para lá de mim, nem me deixa ver para lá do horizonte, e me deixa abismado perante ela e me deixa sem curiosidade de perguntar ao velho eu ao meu lado se tudo, um dia, vai ser bom, e vai ser feliz, e a vontade de olhar para os mesmos olhos e os mesmos traços e chorar um pouco para dizer que sou gente e essa gente nunca feita de outra coisa que não pedaços de carne e de osso e nada mais que matéria aglomerada que se evaporará um dia. E esse pedaço de gente a perder o fundo do que é, esse pedaço de gente gelatina e qualquer força a destruí-lo. E admitir que se erra nunca tão fácil, e admitir que se acerta ainda menos fácil, e aceitar uma vida para a qual não se pode ver para lá do horizonte ainda menos fácil, e virar a cara para o lado e ouvir responder o velho eu depois de se perguntar acerca de se serás feliz na tua vida: não.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Vontade...

... em realidade de dormir, mas na verdade é só desculpa para não fazer o que devia que é trabalhar e prestar contas à gente que me paga. Ninguém disse que a vida era justa ou que era fácil, bolas mas parece que de vez em quando sai uma vontade tão grande do corpo... brrr. Como andamos? Bem, mal, sei lá, nim. Sonhos que aparecem em redor de assuntos que são os que são, evidente que temos que aceitar que anda a digerir mas não sei. A verdade é que o "não saber" me deixa numa posição "neutral" não sei, nem porquê, nem quero saber ou não quero agora esforçar-me por saber. Vida esta que por vezes nos deixa apenas a olhar o futuro sem medo e sem remorso.
Quero fazer planos, mas de facto apenas estou a ver os barcos passar. É mau isso? Não, enquanto não se caminha, temos tempo para pensar como queremos caminhar, e o meu pensar sai assim, em palavrinhas alinhadas atrás uma da outra, em pequenos textos mais entusiasmantes que outros, e para libertar o que se vai misturando cá dentro.
Sinto falta de tudo o que não tenho, há muito tempo lembro-me de ter deixado essa frase nalgum lado. Sinto falta do que não tenho é por vezes o resumo de um ser humano e da sua capacidade de sentir ambição e de sentir insatisfação. Sentir falta do que não tenho parece-me uma coisa tão romântica para dizer, portanto digo-o, sinto falta do que não tenho.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Falta...

... por vezes um pouco de coragem ou de vontade, e essa falta leva a que não vejam coisas diferentes, longe de casa. Esta semana passou isso, o que parecia ser uma oportunidade de ver outras coisas afinal transformou-se em inércia e medo e os planos de "ir" neste caso "vir" foram por água abaixo. Acabo eu por ficar com o bicho a roer-me e ando cheio de vontade de encontrar um avião e um hotel e ir tirar umas fotos à mata, ou ao outro lado do pais, ou a outro lado de algum lado. Não sei, tenho andado cheio de vontade de viajar, mas parece que o trabalho neste momento me vai deixar ou onde já estou ou de volta a um pais que já conheço. E eu cheio de vontade de ir ver outros mundos.
Fiquei assim, cheio de fome pelas possibilidades, cheio de vontade de ir, mesmo que tenha de ser sozinho, que será, sinto que aceito e acredito na minha felicidade interior.

Esta noite voltei a sonhar, com os meus sonhos de antes, aqueles cheios de recordações que me forçavam a acordar em pânico e o tema o mesmo, e tudo lá, ela, e todo o seu tratar para comigo, e pela segunda vez desde que cheguei onde estou, o meu coração não muda de ritmo, e eu impressionado pela falta que não me faz, e pela capacidade tão grande de suportar a ausência de palavras ou do contacto num momento tão recente deste "life changing event", e eu preocupado por querer encontrar lenha para me queimar, querer justificar que estou sozinho e desamparado, querer exteriorizar toda uma raiva e uma dor que devia ter dentro de mim e nada, e eu à procura da minha raiva e da minha vontade de raiva. E eu preocupado por já não reconhecer o eu na sua reacção ao evento. E pergunto, a final, que se passou?

domingo, 26 de maio de 2013

Apesar...

... de tudo, sabemos que um dia as coisas mudam e vivemos como se não fosse tanto e tão complicado. Sinceramente nunca me vi de outra forma senão a que não estava a viver. Insatisfação, infelicidade, falta de fio condutor para uma vida que afinal não se sabe bem o que se quer, geralmente quer o que não se têm? Por vezes sinto em mim um vazio assim do nada, não que seja por falta de alguém ou por falta de algo, ele surge e quando surge apenas me diz que é tempo de mudar, de partir e ver outras coisas para que se preencha esse vazio com a alegria e a satisfação da descoberta. Uma vez e outra aparece e como qualquer bicho nesta terra, sabe-se que é tempo de ir. E ir, já falei do ir, nem que seja um metro em frente, um quilometro em frente, uma vida inteira em frente.
Por vezes enfrentar o dilema de uma vida quebrada é feito de perguntas e de outros dilemas  acerca do que correu mal, por vezes enfrentar o dilema de uma vida quebrada apenas deveria ser feito de perguntas e dilemas acerca do que pode ser o futuro e a incerteza dele. Penso hoje, na sapiência e maturidade dos meus 300 anos de vida, sim trezentos anos de vida, que já vi suficiente, já conheci suficiente já escutei suficiente para poder sob um ponto de vista bem pessoal e bem meu dizer que o que vem e o que foi são ambos resultados de uma serie de eventos os quais se controla, ou não, ou se têm a ideia de controlar e nunca nos damos conta que estão fora das nossas mãos e vontade. Assim o que fazer? Deixar ao destino? Não sei que isso seja ou exista, por vezes creio que sim outras não, dizer que cada homem é o construtor do seu é levar uma vida de guerra e aflição, navegar pelas inevitabilidades do que acontece é perder o rumo do que somos. Então o que fazer para uma busca imensa daquilo que queremos para nós?
Uma cara bonita, um corpo agradável e amor? Ou afinal tudo depende? Sim tudo depende, por exemplo hoje se falasse com o meu ontem, tudo era diferente, ontem eu assim, hoje eu já de outro modo. E custa perceber para onde vai a razão da existência. Custa mas enquanto a procuro lembro que tenho de viver, seguir respirando e actuando, há dias em que essa actuação é melhor, neste filme não há duplos para o que temos de fazer e portanto é inevitável que por vezes nos magoemos.

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Voltei...

... e voltar apenas um acto como qualquer outro hoje em dia. Mudou tanta coisa em tão pouco tempo. Não que tenha sido muitas coisas na realidade, tanta para mim é o tamanho da coisa e não a quantidade de. Ela foi embora da minha vida, desistiu e eu de tão curioso que me sinto devo ter desistido também. Chorei, dormi mal e agora nada, afinal a tanta coisa era pouca.
Se pouco se pode dizer de amar alguém, não sei, sinto falta sim, como sempre senti, lamento não poder enviar uma sms agora mesmo a dizer isso, ou melhor, não dever enviar uma sms a dizer isso. Tirei o cartão do telefone, de lá se chegar alguma coisa, só recebo depois, um dia destes, e não me faz menos bem ou menos mal.
Ando dormente eu? será que dormente? Por vezes penso que sim e no entanto sinto que estou a olhar para um futuro que não sei onde me vai levar mas que me levará a algum lado espero. Sei lá ela tem um nome e uma cara e um corpo e esse nome e essa cara e esse corpo foram a personificação de um amor imenso que existiu em mim por muitos anos. Terá a minha mente finalmente dito/concluído: "It's time to let go"?
Não sei, estou ainda demasiado fresco e em processo de compreensão do que este fenómeno causou na minha vida.
Não perdi o desejo de fugir, mas nunca foi fugir o que eu quis, foi descobrir, foi compreender, e portanto se isso é claro, os elementos estão dispostos para isso, dependo de mim e não há neste mundo quem queira partilhar comigo uma relação de dependência e amor, e passados tantos anos, eu sinto-me bem com isso.