quinta-feira, 3 de março de 2011

Na sala...

... o meu chefe canta karaoke sozinho, chegou hoje depois de uma semana na África do Sul, Sweet Child of Mine, já lá estive, Superman, Creep, desisti e vim para aqui escrever. No quarto junto do meu um alemão vindo a parte leste da alemanha no outro quarto um exemplar diferente da mesma espécie. algures do outro lado do quintal um turco com duas mulheres, uma na alemanha e outra no egipto. Eu no meu quarto sinto o peso de um dia cheio de vazios mentais, cheios de respostas que não existem, e as que existem não são aceitáveis, não são agradáveis. Na obra pouco ou nada se fez hoje excepto discutir em salas de reunião. No poço de escavação as pessoas parecem alheadas ao que fazer, parecem distantes e longe daquilo que devia ser o foco, parecem que não percebem os sinais, os gestos que lhes faço. Nos meus ombros o peso acumula, e acumula, e torna-se cansaço e sono e desespero e depois vem aquela sensação de disparate. Telefonemas que duram uma hora em que as pessoas tentam aproveitar-se daquilo que não podem ter, daquilo que não deviam ter. Não consigo, eu tento mas não consigo ser cínico o suficiente para olhar alguém nos olhos e dizer a culpa não é minha, a culpa é tua, e todos os dias a quase todas as horas sinto-me assim, pesado nos ombros, debaixo de um fardo tão grande que não me consigo mover, o meu cérebro pára, a minha inteligência, se alguma ainda, vai embora, e eu sinto-me como uma bola de ping-pong atirada de um lado ao outro. E eu sinto que tudo isto tão próximo de terminar, que o meu avião quase ai, que a minha mala a ser feita já daqui a 24 horas, e eu a sentir que a noite tão curta de sono, que sempre parece tão bem dormida e o tão bem dormido tão diferente do longamente dormida, e eu tão aflito quando não tenho respostas, quando apenas tenho de dar a cara por algo que não resulta, quando as pessoas não tem coragem para perder um cliente, para dizer, acabou-se, já perdemos demasiado dinheiro aqui. Quando o nosso director geral nos olha de frente, nos sorri e apenas diz: "tens uma obra de merda, tiveste azar" de repente sinto-me como um privilegiado, como aquele que ganhou a sorte grande para ser enterrado no meio daquilo que a obra é, e estou tão próximo desse limite meu Deus, se ao menos pudesse esquecer que amanhã tenho de trabalhar, e apenas fazer a mala, dormir, fazer a mala e dormir, e esperar no lounge pelo avião que não chega, e quando chega esperar sentado na cadeira que as portas se fechem e nunca mais se fecham, e quando se fecham eu tão aliviado, o meu telefone não vai tocar, ninguém me virá dizer que precisa de umas luvas, que precisa de um capacete, umas botas, dizer que tudo em Angola uma porcaria, se é porque insistes em voltar? talvez porque os euros de Angola dobrados e triplicados dos euros na Alemanha hein? se calhar um dia digo-te, se calhar não porque não voltas e eu arranjei forma de não voltares. Se calhar eu mereço porque maquino e engendro nos bastidores algumas vezes. Se calhar eu falso quando preciso, e quando preciso eu mais falso que todos juntos. Talvez sejam detestáveis pessoas falsas, talvez eu detestável, quem me dera poder dormir sossegado com a minha mente tranquila. Quem me dera não ter de pensar que tudo na minha vida resultado das mentiras do que parece ser o meu trabalho. Quem me dera um dia ter a coragem para fugir, e mais não voltar.