domingo, 17 de outubro de 2010

Um dia...

... acordei à hora normal, seis e trinta da manhã, e da mesma forma como no dia anterior e como nos dias seguintes, levantei-me, tomei banho, coloquei uma roupa tirada do armário da mesma forma como se tira uma bola vermelha de um cesto cheio de bolas vermelhas, o mesmo que dizer a primeira que vem à mão, e segui para o trabalho, a cidade àquela hora ainda um pouco vazia, segunda feira é sempre um dia de demora a chegar ao trabalho, atrasos porque o fim de semana ainda agarrado à mente e ao corpo. Peguei no carrito pequeno que me deram, gasto de mau uso não de idade e subi contornei a obra nova da assembleia, subi a rua que passa junto ao ministério da justiça, fiz o retorno no hospital e desci a rua até cruzar com a avenida. O escritório ali junto de mais um bairro de miséria que perde terreno para as vivendas chiques e novas das empresas que se instalam ou das embaixadas que vão abrindo por esta terra de petróleo e diamantes, de agricultura e oportunidades de que todos querem conseguir ter um pedaço. Obras novas na minha cabeça, ideias para brilhar e para concretizar sonhos, vontade de ser mais forte e mais capaz de lidar com os problemas da semana anterior. Por momentos, como todas as minhas ideia, considerei o disparate de respirar já as ruas desta pequena cidade tão agitada como se respirasse as ruas da minha primeira cidade, e o disparate a surgir do facto de as conhecer melhor aqui do que lá, onde vivi durante anos. Como sempre, pensei em amor, não haverá dia que dele não me lembre, e nesse campo eu tão dividido entre a vontade de gritar o grito da libertação e viver aventuras, correr o mundo com a mochila e esquecer que se precisa de amar alguém, e com a vontade de encontrar uns braços ternos e confortáveis que me segurem e me garantam que tudo está bom.
Uma vez olhei uns olhos bem azuis e julguei ter visto neles uma resposta à minha divisão, esses olhos viram-me e pensaram algo que eu não sei nem consigo adivinhar, e no entanto eu incapaz de fazê-los perceber que os quero, que os procuro tantas vezes de uma forma ávida, que os queria para mim. Chego ao escritório, as obras apesar de novas não começaram ainda e eu sento-me por lá a resolver papelada e a julgar o que será quando elas começarem. Deixar de poder ir para onde quero e levar-te, deixar de te ver.
Diria que descobri que me apaixonei a uma segunda feira pela manhã, e no entanto não tenho coragem para o concretizar. Talvez um dia quando for mais antigo, mais usado que agora me consiga perceber e emendar pela forma que a minha timidez me impede de te dizer o que julgo sentir. E seria belo o dia em que o fizesse.

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